A FOTO OXIDADA
Poema de Antonio Miranda
- Longe de mim,
comigo mesmo.
Vejo-me outro
— Tal qual fui
numa fotografia
oxidada:
— vestígios de mim,
irreconhecíveis,
irreconciliáveis.
Não sou eu
aquele jovem “gazela”
sobre a bicicleta
atirando-se no abismo...
Ou era, se é que fui.
Do distanciamento
da paisagem e do tempo
o desvendamento impossível,
pouco resta do que fui
nesta arqueologia do ser.
- Se fui, já não sou
— mas também aí está a foto
inclemente
acusando-me
por comparação.
E que terrível
é ver-se outro:
verso e inverso.
Sim: O tempo oxida
a foto
e a pessoa
sem clemência.
Não me julgo, nem
me entendo.
Aquele jovem
de olhar indagativo
— ele tinha as respostas
que eu não mais
tenho.
- Impossível revê-lo
sem julgá-lo
ou condená-lo.
O corpo é que
faz o julga mente.
Como forças divisórias
como pesos e medidas
que se afastam,
de variada bitola.
Aquele menino da foto
não mais existe
— existo eu
que o contradigo.
Ilustração gerada por IA, por
Nildo Moreira, em 2025.
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